A Inteligência Artificial, a automação e o trabalho remoto moldaram novas realidades laborais, desafiaram modelos tradicionais de liderança e alteraram profundamente as competências exigidas no mercado de trabalho. Neste novo paradigma, enquanto as competências técnicas (hard skills) continuam a ser necessárias, são as soft skills, como a empatia, o pensamento crítico, a adaptabilidade e a comunicação, que emergem como diferenciais essenciais e, muitas vezes, decisivos.
A edição de 2025 do relatório “The Future of Jobs” do World Economic Forum (WEF) confirma esta tendência: entre as competências mais valorizadas até 2030, destacam-se predominantemente soft skills, como a resiliência e a flexibilidade; a liderança e a influência social ou a criatividade e a motivação. Este é um sinal claro de que, na era digital, é a capacidade humana de lidar com complexidade, ambiguidade e mudança que está no centro da evolução profissional.
Mas o que são, afinal, as soft skills? São competências comportamentais e relacionais que definem a forma como um indivíduo interage com os outros, como reage a desafios e resolve problemas ou contribui para um ambiente colaborativo. Ao contrário das competências técnicas, que podem ser mais facilmente automatizadas ou aprendidas em cursos especializados, as soft skills requerem desenvolvimento contínuo, introspeção e experiência prática.
A digitalização e a automação trouxeram uma aceleração dos processos produtivos, mas também criaram um vazio relacional: o e-mail substituiu a conversa, os dashboards substituíram a análise crítica, e o trabalho remoto colocou a colaboração à prova. Nesse cenário, habilidades como a escuta ativa, a gestão de conflitos ou a capacidade de liderança empática tornaram-se não apenas relevantes, mas estratégicas para a produtividade e o bem-estar organizacional.
De acordo com o relatório do WEF de 2025, 63% dos empregadores identificam as lacunas de competências como a principal barreira à transformação empresarial. Além disso, 85% planeiam dar prioridade à requalificação e atualização das competências dos seus colaboradores, com 70% a preverem contratar pessoal com novas competências, 40% a planearem reduzir pessoal cujas competências se tornem menos relevantes e 50% a planearem transitar pessoal de funções em declínio para funções em crescimento. Estes são dados que reforçam a urgência de integrar o desenvolvimento de soft skills nas estratégias de reskilling e upskilling, não só como complemento técnico, mas como um pilar central da empregabilidade e da competitividade organizacional.
É um erro comum pensar que a evolução tecnológica desvaloriza o papel humano. Na realidade, ela redefine-o. As máquinas processam,
mas não sentem. Os algoritmos aprendem, mas não intuem. A criatividade, a ética, a empatia e a capacidade de inspirar são, e continuarão a ser, profundamente humanas.
Empresas tecnológicas como a Google, a Microsoft ou a SAP, já integram avaliações de soft skills nos seus processos de recrutamento e progressão na carreira. Mais ainda, promovem programas de formação em competências como mindfulness, escuta empática ou gestão da diversidade cultural, reconhecendo que estas habilidades potenciam a inovação e a agilidade organizacional.
Neste contexto, o papel dos líderes também está a ser redesenhado: já não basta “gerir recursos”; é preciso liderar com propósito, cultivar culturas de confiança e criar ambientes de aprendizagem contínua.
É possível afirmar que a ascensão das soft skills não é uma moda passageira. É uma resposta sistémica às exigências de um mundo em constante transformação. O futuro do trabalho será, inevitavelmente, híbrido – entre humano e digital, técnico e relacional, racional e emocional.
Aqueles que souberem combinar competências digitais com capacidades humanas profundas estarão mais bem preparados para liderar, inovar e prosperar. Para os profissionais de Recursos Humanos e para os gestores em geral, o desafio será criar ecossistemas de aprendizagem onde estas competências sejam desenvolvidas de forma transversal, contínua e personalizada.
Mais do que preparar pessoas para o futuro do trabalho, é tempo de preparar o trabalho para as pessoas. E isso começa por reconhecer que, na era digital, as soft skills são o verdadeiro superpoder humano.
Patrícia Bispo
Head of Learning and Development – Soft Skills, GALILEU