Muito tenho escrito sobre inovação social nos últimos 16 ou 17 anos. Desde que se falou em inovação social em Portugal, nos idos anos de 2007/2008. E muito mudou desde então.
Portugal mudou – passou de um país pioneiro, a nível Europeu, com a criação da Plataforma de missão do Portugal Inovação Social, a referência internacional e Hub europeu de Inovação social. Com 698 projetos de inovação social, 481 organizações e 848 investidores de impacto envolvidos nos financiamentos de 152 milhões de euros concedidos desde a sua criação.
Os portugueses mudaram, na sua consciência sobre alguns dos principais problemas que afetam a sociedade. Segundo dados publicados pelo Banco Europeu de Investimento, relativos a um inquérito sobre o nível de informação e conhecimento sobre as consequências das alterações climáticas na União Europeia (UE27), os portugueses ocupam o quarto lugar no ranking, muito acima da média europeia. Mas – e um grande “mas”, que julgo ser fundamental, como mais à frente explico, para perceber o que ainda falta fazer – o seu conhecimento sobre as soluções é menor.
Os portugueses mudaram, também, no grau de materialização das suas iniciativas de empreendedorismo social (que inclui o ambiental), muito apoiados pelo desenvolvimento de ecossistemas locais, que criaram as condições para que novos projetos proliferassem um pouco por todo o País, como o demonstram as 35 incubadoras de inovação social que atualmente existem espalhadas por todo o território nacional.
As universidades de referência em Portugal incluíram, na sua oferta, cadeiras, cursos, programas, abertos e customizados, conteúdos relacionados com inovação social, investimento de impacto, empreendedorismo de impacto. Centros de conhecimento e investigação aplicada nestas áreas foram criados nas academias de referência, sobretudo na área de economia e gestão, mas não somente.
Ora, com todo este referencial que denota um crescimento exponencial, nesta última década ou pouco mais de uma década, da influência que a inovação social tem tido na política, nas empresas e nas comunidades, resta perguntar – mas então o que falta fazer?
A resposta a esta pergunta é ampla e demorada. E não pode ser simplista, mas deve ser simplificada. A verdade é que se repete, nesta matéria, uma máxima que é aplicável a muitas outras realidades – quanto mais se faz, mais há por fazer. Mas talvez seja útil focar aqui um pouco e focar naquilo que poderá, eventualmente, faltar fazer – ou antes, nas oportunidades que faltam desbravar – do lado das empresas. Como é que as empresas podem integrar, de forma eficaz e com impacto nos seus negócios, a inovação social no seu modus operandi?
É a esta pergunta que a nova tendência do Corporate Social Innovation (CSI) procura dar resposta. As diferente abordagens de CSI partem do pressuposto de que a capacidade de desenho e implementação de modelos eficientes e eficazes de negócio, que as empresas têm, em conjunto com a capacidade que têm de gerar recursos financeiros e não financeiros, aplicadas à resolução de problemas sociais e ambientais, podem ser o game changer na inovação social, e na mentalidade ainda dominante sobre as formas de fazer negócio. Mas, mais do que isso, acredita que, no médio e longo prazo, as empresas que não integrarem na sua cadeia de valor, a possibilidade de gerarem impactos positivos nos diversos layers de stakeholders, mais do que diminuírem impactos negativos da operação (que é, no fundo, o que tem sido o cerne do fenómeno da sustentabilidade nas empresas), mais do que perderem vantagens competitivas, colocam em risco a sua própria relevância e, como tal, a sua subsistência.
E como é que podem então, as empresas, integrar ou incorporar a inovação social no seu negócio? De várias formas:
Uma das mais simples, é através do chamado social procurement – todas as empresas têm processos de procurement. O que esta abordagem vem sugerir é que se incluam, na lista de entidades integradas na cadeia de valor, negócios que já tenham, no seu ADN e missão, a geração de impacto social ou ambiental positivo. Aqui trata-se apenas de fazer um bom processo de adaptação a este tipo de negócios e juntar um processo de screening eficaz, para o qual já existem ferramentas e modelos que têm dado resultados em empresas como o IKEA, ou a Danone.
Também através da criação de uma cultura de intra-empreendedorismo, focada em detetar oportunidades de desenvolvimento de produtos e serviços, alinhados com o negócio central das empresas, mas que deem resposta a desafios sociais e ambientais detetados ao longo da cadeia de valor, nos diferentes segmentos de stakeholders, uma empresa pode incorporar a inovação social como um mindset e um MO.
A este último ponto podemos juntar a possibilidade de criar uma plataforma de inovação aberta, convocando, nos processos de criação e desenvolvimentos de produtos e serviços,, negócios e start ups de missão, entidades externas às empresas que acrescentem maior riqueza e diversidade aos processos de desenvolvimento de negócios que poderão ficar dentro da empresa ou, eventualmente, gerar spin offs, se fizer sentido.
Desenvolvendo estratégias de investimento de impacto, que apostem e tenham em conta, nos critérios de seleção de investimento, os retornos a médio e longo prazo, e o filtro do impacto positivo na sociedade e ambiente.
E poderia continuar, com muitos e bons exemplos de formas e alternativas de se levar a inovação social a outro patamar, dentro das organizações empresariais. Mas tudo isto só poderá realmente acontecer, quando as lideranças perceberem o enorme potencial que esta abordagem poderá significar. E a construção desta proposta de valor cabe a todos os que, neste ecossistema, já têm o conhecimento do que funciona e não funciona. Mas também parte da abertura de quem decide, a ouvir e a experimentar, mesmo sem saber ao certo se vai funcionar totalmente.
Foi isto que um enorme empreendedor e inovador deste país – Diogo Vasconcelos – nos ensinou, através do seu exemplo, há já mais de 13 anos, nos primórdios deste novo mundo da inovação social, quando ainda ninguém sabia bem do que estávamos a falar. É desta ousadia que o País está a também precisar, da parte de quem tem o poder de decisão nas suas mãos. É para isto que todos os dias trabalho. E é com isto em mente, que todos os dias acordo.
Frederico Fezas-Vital
Executive Director, Católica-Lisbon Yunus Social Innovation Center
Descarregue aqui a 21ª Edição da Revista Game Changer