Temos observado o crescimento e a relevância do conceito ESG (Environmental, Social, and Governance) nas organizações, aumentando o interesse e a variedade de abordagens às temáticas ambientais, sociais e de governança.
Dentro do pilar social, a Responsabilidade Social Corporativa (RSC) tem vindo a ganhar terreno e a ver surgir regulamentos e obrigatoriedades legais que incentivam à sua intervenção como uma forma válida de estimular a implementação de práticas, apesar de não ser a única. Por exemplo, em 2024, a Diretiva Europeia sobre Devida Diligência de Sustentabilidade Corporativa (CSDDD) foi aprovada pelo Parlamento Europeu, reforçando a responsabilidade das organizações em promover práticas sustentáveis e respeitar os direitos humanos sendo responsáveis não só por identificarem como prevenirem, atuarem e corrigirem as violações no que diz respeito aos direitos humanos e danos ambientais, ligados a toda a cadeia de valor.
Além do dever e responsabilização para um envolvimento comunitário mais justo, é fundamental que este esteja alinhado com o core e a estrutura de uma organização, onde se espera que a missão da Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI) seja a chave e que faça parte do ADN e da cultura da organização.
Apesar de não ser ainda um dos temas com maior destaque dentro das organizações ao nível da sustentabilidade, é possível argumentar que a DEI tem um papel determinante para a coerência e coesão das políticas e práticas dos seus vários âmbitos devido ao seu caráter transformador e “efeito cascata”.
O impacto e o papel da DEI na estratégia de Responsabilidade Social de uma organização encontra-se ainda muitas vezes subvalorizado, limitando-se à abordagem social interna e focando-se, maioritariamente, nas suas pessoas colaboradoras. Esta é, sem dúvida, uma significativa fatia da DEI no contexto organizacional e é também a componente que permite uma maior quantificação de progresso ao nível de práticas sociais (representatividade em cargos de liderança; quotas; satisfação das pessoas trabalhadoras). No entanto, dentro do universo da RSC de uma organização, uma abordagem e “lente” DEI tende a criar impacto mais positivo a longo prazo para a cultura organizacional e chegar a mais comunidades e/ou grupos.
Aplicar uma perspetiva de DEI nos vários segmentos de uma organização é permitir que esta se torne socialmente responsável e que garanta um verdadeiro e eficaz impacto em toda a sua cadeia de valor.
A Perspetiva da DEI no Pilar Social
Historicamente, a Responsabilidade Social tem sido direcionada para as comunidades externas e a DEI para as comunidades internas de uma organização. A experiência no tema tem vindo a provar que esta distinção se mostra contraproducente. Uma estratégia de RSC deve ser concertada, tanto interna como externamente, abraçando os conceitos de DEI para garantir que quaisquer ações e iniciativas planeadas espelham a diversidade das e nas comunidades que impactam e as perspetivas de todas as partes interessadas.
Procurar a inclusão nesta mesma estratégia também é fundamental, garantindo a promoção de comportamentos que permitem aos stakeholders uma melhor inclusão e integração na organização e na comunidade envolvente.
O compromisso com os direitos humanos, transversal às comunidades envolvidas em toda a cadeia de valor, beneficia também de uma visão de DEI para contribuir para mudanças significativas, indo além da auditoria social e devida diligência, tornando este processo mais humanizado e alterando as práticas que poderão também mudar vidas.
Uma organização socialmente responsável ganha e impacta mais através da comunicação, sendo este outro dos âmbitos onde a DEI poderá vir a ser uma vantagem. Apesar de muitas vezes não ser devidamente comunicada pelo foro mais sensível do seu conteúdo, a perspetiva de DEI é crucial para garantir uma comunicação inclusiva, que impacta positivamente e determina o quão valorizados podem sentir-se grupos menos representados, dentro e fora da organização – e o contrário.
Já na comunidade interna, a DEI pode deixar de ser uma componente de trabalho mais isolada e tornar-se na ligação que promove uma estratégia de RSC mais inclusiva e envolvida. Com partilha e acolhimento de pessoas trabalhadoras diversas, cria-se espaço para a construção de planos e estratégias sociais que representam mais e melhor a comunidade envolvente. Através da participação de pessoas trabalhadoras no pilar social de uma organização é possível fazer crescer não só a motivação e confiança de quem trabalha, como também aumentar o impacto e o valor de quaisquer planos e medidas implementadas.
A Perspetiva da DEI no Pilar da Governança
Ao adotar uma perspetiva de DEI transversal a uma governança mais responsável, a organização está a permitir que as chefias adotem um compromisso de equidade e inclusão, fomentando tomadas de decisão mais equilibradas e justas, e reduzindo significativamente o risco de resultados enviesados. Implementar a DEI permite às organizações uma visão mais clara e inclusiva de sucesso e sustentabilidade, promovendo a inovação, a criatividade, a adaptabilidade, a resolução de problemas e a competitividade com base em diversas perspetivas.
Perspetivas mais diversas abrem portas para relações mais fortes e inclusivas com stakeholders, fomentando a reputação, o posicionamento no mercado e o estabelecimento de princípios éticos e morais organizacionais. Ao alinhar a governança aos esforços da DEI, toda a organização fica equipada com uma visão mais responsável para com o seu envolvimento na sociedade, acabando por gerar um “efeito dominó” até à força de trabalho – que se sente alinhada com a organização e, por esse motivo, mais envolvida e motivada em contexto de trabalho.
A Perspetiva da DEI junto de stakeholders
É também na relação com entidades fornecedoras e parceiras que a responsabilidade social pode ser colocada em prática. Tornando-se cada vez mais numa preocupação para as organizações – apesar de ainda com um fraco investimento -, a escolha de entidades fornecedoras e parceiras responsáveis poderá ser também vista utilizando uma perspetiva de DEI.
Uma organização responsável e inclusiva deverá estender os seus esforços para garantir que todos os seus negócios – locais, pequenos e médios, geridos por mulheres ou minorias, entre outros – têm a oportunidade de pertencer à sua cadeia de valor. As exigências regulamentares e legais para fornecedores sustentáveis acarretam responsabilidades que nem todos os negócios (como os pequenos e, em alguns casos, os médios), não conseguem corresponder, pelo que o acolhimento da diversidade e o princípio da equidade tomam um papel fundamental neste processo.
Implementar uma visão de DEI permite uma melhor compreensão deste panorama de negócios e a adaptação de requisitos – muitas vezes construídos para grandes organizações -, dando destaque ao valor da diversidade e ao impacto que as parcerias com negócios locais e de menor dimensão podem ter na comunidade envolvente. Desta forma, a inclusão torna-se transversal e o impacto social vai além da filantropia, apoiando comunidades e os seus negócios a florescer de uma forma sustentada e estruturada.
Além de entidades parceiras, tem-se verificado um crescente interesse nas temáticas da DEI e da responsabilidade social por parte das pessoas consumidoras, nomeadamente no que diz respeito aos padrões de consumo das gerações mais recentes. Nesse sentido, as organizações, ao adotar uma “lente” de DEI, conseguem convergir com as exigentes necessidades do mercado com os valores éticos e morais dos futuros consumidores.
Hoje em dia, numa atualidade cada vez mais preocupada e investida em gerir, participar e consumir de e para organizações mais responsáveis a nível ambiental, social e de governança, é indispensável colocar a DEI no centro da discussão.
A Responsabilidade Social necessita de ter como base a diversidade, a equidade, a pertença e a inclusão como elementos-chave para qualquer iniciativa, equilibrando metas e respostas a indicadores com uma visão mais humana do seu papel. A adoção de uma estratégia e perspetiva de DEI nos esforços de RSC pode, assim, permitir às organizações um maior impacto na cultura organizacional, alcançando mais comunidades de uma forma mais transformadora.
Margarida Mateus de Carvalho
Coordenadora de Projetos, Associação Portuguesa para a Diversidade e Inclusão (APPDI)
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