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16 de Fevereiro de 2024

Reflexões sobre Flexibilidade Laboral e Novos Paradigmas – Game Changer 19

Em 2020 a flexibilidade laboral foi central para a sobrevivência de muitas organizações, sendo determinante para a sua adaptabilidade, eficácia e competitividade. No atual contexto de mudanças rápidas e evolução constante, é encarada como um fator estratégico para as empresas.

Por motivos óbvios, o lado mais visível da flexibilidade laboral é o teletrabalho e a capacidade de ajustar horários, modalidades e locais de trabalho. Capacidade essa que permite às organizações uma resposta ágil perante as exigências do mercado e um instrumento valioso para atrair e reter talentos, tendo em conta a crescente importância que os profissionais atribuem a um equilíbrio saudável entre trabalho e vida pessoal.

Mas a aplicação da flexibilidade laboral é mais do que o teletrabalho e desempenha um papel crucial nos departamentos internos, nomeadamente nos Recursos Humanos. A flexibilidade laboral permite ajustar a proposta de valor da organização a cada colaborador, tendo em conta o seu perfil e necessidades. Além disso, uma cultura organizacional que promove a flexibilidade laboral permite o surgimento de equipas autónomas e responsáveis, chefias mais dinâmicas, e uma cultura de desenvolvimento de competências contínuo.

As decisões e ações neste domínio promovem ambientes de trabalho mais saudáveis mas também para a eficiência operacional global da organização, resultando em equipas mais produtivas e empenhadas.

O presente artigo, resulta do segundo encontro do Think Tank RH da GALILEU e contou com a colaboração de 3 membros fundadores: Cláudia Ferreira (Diretora de Recursos Humanos, Covipor – Companhia Vidreira do Porto); Mafalda Silva (HR Operations Analyst, Continental Engineering Services); Renata Venâncio (Learning & Development Specialist, Janssen Pharmaceutical Companies of Johnson & Johnson), que partilharam os avanços e práticas das respetivas organizações ao nível de flexibilidade laboral.

 

NOVOS MODELOS DE TRABALHO

A pandemia serviu de catalizador para a adoção de novos modelos de trabalho nas organizações dos mais variados setores. De acordo com as suas realidades, as empresas foram adotando os seus modelos preferenciais – presencial, remote ou híbrido – adaptando-os às suas realidades. Na Covipor – Companhia Vidreira do Porto, segundo Cláudia Ferreira, “foi implementado o teletrabalho até dois dias por semana, ou seja, um regime híbrido. Algumas pessoas têm apenas um dia em teletrabalho mas o modelo permite até dois dias por semana em teletrabalho”. No caso da Covipor – Companhia Vidreira do Porto, “os dias em teletrabalho são fixos, havendo a possibilidade de trocar em situações que o exijam”. Também na Janssen o modelo híbrido é o aplicado, com 3 dias presenciais e dois dias em remote work, e “já o era antes da pandemia”, indica Renata Venâncio, “o nosso modelo é relativamente flexível. Há pessoas que vêm todos os dias, outras vêm semana sim semana não… É alinhado com o manager e é definido caso a caso”.

No modelo híbrido, a distância entre colaboradores é contrabalançada pelos dias de trabalho presencial. Por esse motivo, a Continental Engineering Services tem uma abordagem um pouco diferente. Segundo Mafalda Silva “um dia por semana é o dia da equipa e o objetivo é que toda a gente venha nesse dia. Tentamos garantir que pelo menos um dia por semana as equipas estão todas juntas para fomentar o espírito de equipa” e indica que “Os outros quatro dias acabam por ser flexíveis, embora algumas pessoas trabalhem presencialmente mais dias; dois, três ou quatro… E há outras que gostam de estar sempre cá e estão sempre cá”.

Mas a flexibilidade no modelo de trabalho pode passar também pela flexibilidade de horários, inclusive em realidades de produção. Como se promove a flexibilidade numa realidade onde ela não existe? Para a Diretora de Recursos Humanos das Covipor – Companhia Vidreira do Porto tem sido desenvolvido trabalho com as chefias no sentido de criar alguma flexibilidade de horários para, “se o colaborador precisar de chegar mais tarde ou de sair mais cedo, poder de alguma forma, compensar aquelas horas, em vez de ter de imediato o desconto pela ausência”. Cláudia Ferreira refere que “numa realidade de trabalho por turnos, em que entra um e outro sai, às vezes é difícil fazer essa gestão, mas temos conseguido”.

Na Continental Engineering Services, a flexibilidade laboral também se reflete em horários flexíveis. Mafalda Silva refere que “existe uma lógica de 40 horas semanais, mas sem um regime de picagem de ponto; não estamos a controlar se as pessoas entram às oito, às nove ou às dez”, referindo que esta flexibilidade permite ajustar horários de forma a ser possível “não trabalhar a sexta à tarde ou não fazer a sexta-feira” por completo, salvaguardando que isto depende sempre dos projetos e compromissos existentes.

 

FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS

A flexibilidade laboral desempenha igualmente um papel vital na formação e desenvolvimento dos colaboradores, permitindo-lhes equilibrar eficazmente o trabalho e a vida pessoal. Os horários flexíveis e os modelos de trabalho remoto não promovem apenas um ambiente mais saudável, também facilitam a participação em programas de formação e desenvolvimento profissional. Esta abordagem demonstra confiança na autonomia dos colaboradores, mas também incentiva a inovação e a capacidade de adaptação dos profissionais às mudanças no mundo profissional. É essencial para capacitar os colaboradores a adquirir novas competências, contribuíndo assim para o seu crescimento e sucesso profissional.

A Continental Engineering prepara o plano de formação de cada colaborador tendo em conta o seu perfil e necessidades. Além disso, a sua HR Operations Analyst realça a utilização de “licenças Udemy e Coursera, que podem ser utilizadas pelos colaboradores. Estes têm a liberdade, durante aquele período de tempo, para fazer todos os cursos que estão disponíveis na plataforma”; algo que considera que os colaboradores percepcionam como um factor motivacional, por terem a oportunidade de realizar a formação que pretendem sem custos.

Com uma média de idade dos trabalhadores mais elevada e um histórico de desenvolvimento de competências essencialmente técnico na organização, Cláudia Ferreira tem desenvolvido o plano da formação da Covipor – Companhia Vidreira do Porto. Desde que entrou para a organização há cerca de ano e meio tem alargado o desenvolvimento de competências das equipas para incluir as áreas comportamentais, de trabalho e relacionamento em equipa, comunicação e assertividade optando por formatos de formação mais dinâmicos. A Diretora de Recursos Humanos refere sentir receptividade por parte dos managers em participar deste processo e olhar para os colaboradores e respetivas funções e perceber o que é necessário para que possam evoluir – “o objetivo é realmente que as pessoas se sintam valorizadas”.

Além de manter os trabalhadores motivados, ao nível do desenvolvimento de competências, a flexibilidade laboral é uma forma de a organização estar preparada para os desafios. Numa altura particularmente difícil a nível de recrutamento, a capacidade de desenvolver nos trabalhadores novas oportunidades de carreira pode ser decisiva para o sucesso das organizações. Segundo Renata Venâncio, na Janssen a formação é dividida em 2 eixos: Um diz respeito a competências específicas a desenvolver por cada colaborador tendo em conta as especificadades das suas funções. Este desenvolvimento é particularmente importante dada a regulação de que é alvo o setor farmacêutico. No segundo eixo a mensagem a passar é You Own Your Career, “tu és o autor e o dono da tua carreira e do teu desenvolvimento”. A Learning & Development Specialist refere que, “sempre apoiado no seu manager, o colaborador deve começar por desenhar o seu percurso, através de um exercício de reflexão de quais são as suas competências. Este exercício inicial, propõe uma reflexão sobre o que liga o colaborador ao seu trabalho, ou seja os ‘Career Engagers’, os seus valores, a sua satisfação atual, entre outros. Para que esse desenvolvimento se efetive, a Janssen disponibiliza um autêntico ecossistema de desenvolvimento, ou seja um software que disponibiliza um amplo leque de experiências que variam entre programas de mentoring, programas de exposição a novas experiências profissionais (Grow Gig’s) e programas de Learning (formal) com a disponibilização de formação (Cursos, Worksheets, artigos, entre outros). Este ecossistema de desenvolvimento utiliza um software que através de um algoritmo vai sugerindo itinerários formativos com base no exercício inicial e nas competências que o colaborador pretende desenvolver”.

A área da formação é de facto bastante flexível e permite inclusivamente uma flexibilidade também a nível de carreira. Dando a oportunidade às pessoas de perceber se pretendem evoluir na área ou testar se outros percursos podem ser interessantes profissionalmente.

 

LIDERANÇA E AUTONOMIA

As participantes frisam que a flexbilidade laboral, apenas funciona se existir apoio por parte das chefias, Renata Venâncio indica que na Janssen já era assim antes da pandemia, “nós já eramos assim, o nosso horário já era variável e flexível, faz parte da cultura, do ADN, e por isso mesmo é promovido pelas chefias”.

Para que tudo funcione é necessário existir uma cultura de responsabilização e respeito, e o facto das organizações permitirem a flexibilidade em momentos em que o colaborador mais necessita, acaba por trazer um ainda maior grau de proximidade na relação que este tem com a sua empresa e tem mais predisposição em “vestir a camisola”. Na Covipor – Companhia Vidreira do Porto, a equipa de RH trabalha atualmente para implementar uma cultura TEC (Trust, Empowerment and Collaboration), “que e é algo que nós realmente acreditamos na questão do empoderamento das pessoas, da confiança que nós damos às pessoas para elas desenvolverem o trabalho, poderem aprender com os erros”, reflete Ferreira.

 

SEMANA DE 4 DIAS

A semana de 4 dias tem sido amplamente discutida como uma abordagem inovadora para redefinir o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal bem como no que toca a questões de produtividade. À medida que a sociedade evolui e as prioridades mudam, surgem debates acerca dos benefícios e desafios dessa proposta.

Renata Venâncio aponta que, na sua opinião, a semana de 4 dias terá de ser o futuro, até porque, além de ser um assunto na agenda do dia, “há estudos que comprovam que é positivo, não diminui produtividade, nem eficácia”.

Cláudia Ferreira indica que “é necessário perceber o tipo de empresas em que são baseados os estudos”, indicando que no nosso país, e apesar de se declarar defensora da semana de 4 dias, considera que tem de ser algo bem pensado e aponta os baixos salários do nosso país como uma possível ameaça ao efeito que se pretende ao implementar este formato “pode não ter o efeito que seria suposto, o de as pessoas poderem usufruir da sua vida pessoal”.

Renata concorda que faz toda a diferença o local e/ou organização onde os estudos são aplicados e indica que o grande imperativo nesta temática é a cultura da empresa. Isto é, empresas que possuem a tal cultura de responsabilidade, respeito e confiança da qual advém a flexibilidade, estarão mais preparadas a implementar este modelo.

 

PERSPETIVAS FUTURAS

Numa reflexão sobre o futuro e evolução da flexibilidade laboral, Mafalda Silva afirma que “é sempre possível melhorar, testando, experimentando, de modo a verificar o que pode resultar em determinado contexto e ir ao encontro das pretensões dos colaboradores, seja a  nível de horário, espaços de trabalho ou outros benefícios, sem que os objetivos das organizações sejam descurados ou comprometidos”. Considera ainda que a tendência de mercado, é para que exista cada vez mais um maior nível de flexibilidade até se encontrar o equilíbrio.

Renata Venâncio considera este “o tema”, e lembra que as novas gerações que estão a sair/ou sairam recentemente da faculdade e que estão a ingressar no mercado de trabalho pretendem sobretudo o benefício, “o que eles pedem é desenvolvam-me e sejam flexíveis. As novas gerações querem ter esta flexibilidade, ter opção de desenvolver o seu trabalho até do outro lado do mundo, e a verdade é que as organizações têm que se adaptar e dar esta flexibilidade, que é vista cada vez mais como um benefício”.

Para demonstrar as mudanças que se verificam, Renata dá o exemplo de que “há uns anos um grande benefit era ter carro da empresa, hoje em dia muitos jovens, preferem ter um valor anual para gastar na Uber, querem mobilidade, rapidez, flexibilidade. Quando se precisam de deslocar chamam um Uber e vão para onde quiserem, isto diz muito do mindset que está a chegar ao mercado de trabalho”. Nesse sentido, pode-se afirmar que a flexibilidade laboral acaba por ser um fator determinante para a atração e retenção de talento; “Temos que estar flexíveis para absorver este talento, porque este talento é diferente”.

Em conclusão, a Flexiblidade Laboral é um tema central nas empresas, destacando-se como fator estratégico para a adaptabilidade das organizações às necessidades do mercado. A capacidade de ajustar horários, modalidades e locais de trabalho não só se revela uma vantagem competitiva, mas também promove o equilíbrio entre vida profissional e pessoal. A flexibilidade laboral é fundamental nos Recursos Humanos, onde a recolha e análise de dados impulsionam práticas eficazes para a produtividade ou o desenvolvimento de competências.

 

Artigo Think Tank RH, com participação dos seguintes membros:
Cláudia Ferreira, Diretora de Recursos Humanos , Covipor – Companhia Vidreira do Porto
Mafalda Silva, HR Operations Analyst, Continental Engineering Services Portugal
Renata Venâncio, Learning & Development Specialist, Janssen Pharmaceutical Companies of Johnson & Johnson

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Descarregue aqui a 19ª Edição da Revista Game Changer

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